15 maio, 2014


Dedico às amigas que já viveram mais de meio século.
O ESPELHO

Esse que em mim envelhece
assomou ao espelho
a tentar mostrar que sou eu.

Os outros de mim,
fingindo desconhecer a imagem,
deixaram-me, a sós, perplexo,
com meu súbito reflexo.

A idade é isto: o peso da luz
com que nos vemos.

Mia Couto 

20 agosto, 2011

PARA REFLEXÃO "HISTÓRIA DO BRASIL"

                                                       Causas do Golpe Militar de 1964
                                                          Por Antonio Gasparetto Junior
As causas que favoreceram ao golpe militar ocorrido no Brasil no ano de 1964 são um somatório de diversos acontecimentos políticos e sociais ocorridos ao longo da história republicana brasileira. Ainda durante o período imperial, quando Dom Pedro II era quem governava o país, os militares demonstraram sua insatisfação com as condições vividas pelas Forças Armadas Brasileira. Com o fim da Guerra do Paraguai os militares se conscientizaram que na América Latina apenas o exército brasileiro permanecia sem prestígio na sociedade e na política. A pressão que os militares exerceram foi tão grande que integraram o grupo republicano responsável pela queda do regime monárquico no Brasil, sendo que os dois primeiros presidentes da república recém nascida foram militares.
Ao longo da República Velha os militares só foram se revoltar novamente na década de 1920 quando organizaram um movimento de contestação política novamente, mas os responsáveis pelo movimento eram pertencentes de um escalão intermediário da hierarquia militar, por esse motivo o acontecimento ficou conhecido como Tenentismo. De toda forma, serviu para colocar novamente os militares na cena política nacional e seria um dos fatores republicanos que engrossaria mais tarde a capacidade política dos militares de promoverem um golpe. O governo de Juscelino Kubitschek seria atacado por tentativas de golpe em 1955, mas quem sofreria o impacto maior mesmo seria João Goulart em 1964.
No final do segundo governo de Getúlio Vargas, que se encerrou por ocasião de seu suicídio em 1954, a situação política brasileira estava muito instável, a crise havia fragmentado os destinos da nação. Os militares formavam o grupo que defendia a entrada do capital estrangeiro no país, quando se deu o processo eleitoral para sucessão de Getúlio Vargas tentaram arquitetar um golpe, que não foi bem sucedido e Juscelino Kubitschek assumiu a presidência. Como seu governo foi bem aceito pela população, teve respaldo suficiente para superar os ataques políticos e chegar ao final do mandato.
O sucessor de Juscelino Kubitschek é quem causaria problemas no destino político brasileiro. Jânio Quadros foi eleito com grande maioria dos votos, com tamanho apoio popular o então presidente acreditou que o povo estaria do seu lado de toda forma e elaborou um plano para que seus poderes aumentassem. O presidente Janio Quadros anunciou sua renúncia pelo rádio em 1961 esperando que a notícia causasse espanto no Congresso e na população, se corresse como o esperado Janio Quadros imaginava que seria procurado para voltar ao poder e não causar instabilidade política e então o ex-presidente aceitaria a proposta de retornar ao cargo somente se lhe fosse dado plenos poderes para governar. Entretanto, o plano de Janio Quadros passou longe do esperado, sua renúncia foi aceita e nada foi feito para que voltasse ao poder.
O vice de Janio Quadros era João Goulart, político que surgiu durante o segundo governo de Getúlio Vargas e que por isso tinha fortes identificações com o presidente suicida, causando desagrado nos políticos de direito. João Goulart já era encarado como um político de tendências de esquerda e para piorar quando recebeu a notícia da renúncia do presidente estava na China comunista. A direita política tentou de todas as formas fazer com que o vice não assumisse quando retornasse ao Brasil, mas Leonel Brizola, cunhado de João Goulart, era o governador do Rio Grande do Sul e deu o sustento necessário para que o vice voltasse ao país e assumisse o cargo que agora lhe era de direito.
Ao assumir a presidência, Jango, como era popularmente chamado, enfrentou sérias oposições. A política de Jango tinha claras influências de esquerda, pretendia fazer reformas de base e especialmente reforma agrária. A solução encontrada pelos opositores para impedir o governo de Jango foi instalar o parlamentarismo no Brasil, deste modo haveria presidente, mas as decisões seriam efetivamente tomadas pelo Primeiro Ministro. O parlamentarismo foi aplicado e as decisões do Estado ficaram por conta de três Primeiros Ministros: Tancredo Neves, Francisco de Paula Brochado da Rocha e Hermes Lima. Em 1962 os políticos contrários ao parlamentarismo conseguiram que fosse realizado um plebiscito no qual a população escolhesse entre o presidencialismo e o parlamentarismo. O presidencialismo ganhou e Jango tentou finalmente governar conciliando suas reformas de base com os interesses conservadores. Houve então um desarranjo na situação brasileira, a inflação cresceu aceleradamente, as medidas econômicas causaram insatisfação política e a situação só foi piorando. Estudantes chegaram a organizar movimentos em defesa das ideologias de esquerda, o que só criaria motivos para a perseguição militar mais a frente.
O presidente João Goulart e seus aliados criaram políticas que só causaram insatisfação nos conservadores de direita. Leonel Brizola criou o “grupo dos onze” para fiscalizar parlamentares e militares e pressionar o Congresso para aprovar as reformas de base. As contestações cresceram, a imprensa deu início a uma campanha contra o radicalismo ideológico de Jango, alertando para o caminho escolhido pelo presidente de levar o Brasil para um regime comunista. Estouraram várias revoltas e greves pelas ruas do país, levando Jango a pedir o Estado de Sítio, que foi revogado pelo Congresso.
O grande estopim que colocaria os militares em cena e determinados a tomar o poder através de um golpe seria o discurso de João Goulart e Leonel Brizola feito no dia 13 de março de 1964 na Central do Brasil, Rio de Janeiro. Nesse, os dois anunciavam as reformas de base, reforma agrária, um novo plebiscito para aprovar uma nova constituição e a nacionalização das refinarias estrangeiras de petróleo. Os militares sabiam que o povo apoiaria o projeto e então não perderam tempo, aliaram-se aos políticos da UDN e ao governo norte-americano para deflagrar o golpe. A igreja católica iniciou o apoio contra a ameaça da esquerda mobilizando o povo através da Marcha da família com Deus pela Liberdade contra o governo e para dar legitimidade ao golpe militar. A queda foi inevitável e os militares permaneceram com o poder no Brasil de 1964 até 1985
FONTE:  http://www.historiabrasileira.com/brasil-republica/causas-do-golpe-militar-de-1964/



14 agosto, 2011

Néstor García Canclini Acervo: Educared Argentina Convidado pelo programa Fórum da Fundação Telefônica [Argentina], de incentivo à pesquisa e à geração de conhecimento sobre a sociedade da informação, o renomado antropólogo Néstor García Canclini esteve em Buenos Aires para apresentar o projeto “Estrangeiros da Tecnologia e da Cultura”. O objetivo foi analisar de forma interdisciplinar o impacto das mudanças tecnológicas na cultura e nas relações sociais. Em conversa com a Educared, Canclini falou sobre as novas formas de estrangeiridade geradas na cultura pela “migração do analógico para o digital”, a reconfiguração do conhecimento promovida pelos chamados nativos digitais e ao conjunto do sistema educacional com a mudança sociocultural. EducaRed: O senhor está em Buenos Aires para participar de um seminário interdisciplinar e apresentar o projeto “Estrangeiros da Tecnologia e da Cultura”. De que trata essa pesquisa? Néstor García Canclini: É um projeto de pesquisa promovido pelo Espaço Fundação Telefônica [Argentina] sobre estrangeiros e tecnologia na cultura. Surgiu como pesquisa internacional sediada na Argentina, para explorar as formas ainda pouco estudadas das estrangeiridades. A noção de estrangeiro tem sido abordada pelas Ciências Sociais e pela Literatura. Há também uma produção artística significativa que parece tratar melhor dos conceitos de viagem, migração e estrangeiridades. Mas quase sempre essa noção se refere ao deslocamento de um país para outro e ao trânsito pelas fronteiras, o que traz discriminação ou conflitos entre culturas em decorrência das mudanças geográficas de populações. Este conjunto de trabalhos tem dado conta do impacto histórico das migrações, dos deslocamentos humanos. No entanto, ao estudarmos esses materiais, notamos que apenas 3% da população mundial vive fora de seus países de origem, ainda que em algumas regiões haja índices migratórios muito altos, como é o caso do México, Equador ou República Dominicana. Nestes países, sobretudo, nos últimos 15 anos, de 10% a 15% da população vive em outras regiões devido a diferentes motivações. Os turistas são um pouco mais numerosos, mas não superam 15% da população mundial. Passamos a questionar, então, a que se deve este grande número de pesquisas sobre viagens e migrações no atual contexto. É preciso relembrar que, de 1850 a 1930, cerca de 50 milhões de pessoas migraram para a América. No entanto, esses deslocamentos se davam por razões bastante diferentes das atuais: eram migrações definitivas. Atualmente, porém, as viagens são de ida-e-volta entre países com certa proximidade. Por outro lado, as comunicações eletrônicas, o telefone e a Internet criam correntes de comunicação muito fluidas. ED: O desenvolvimento tecnológico confere novos significados ao conceito de estrangeiridade? NGC: Achamos que existem outras formas de estrangeiridade no mundo contemporâneo. Foi a partir daí que começamos a pensar não só nas formas de estranhamento diante do outro, que se dão quando emigrantes chegam ao nosso país, mas também naquelas que são produzidas quando há rupturas em nossa própria sociedade. Uma das chaves para se perceber isto é o que a comunicação chama de “migração do analógico para o digital”, ou seja, a experiência de estranhamento que nós, adultos, sentimos diante de um jovem nativo das novas tecnologias. Os jovens lidam muito bem com elas, enquanto os adultos, aos 40, 50 ou 60 anos, ao usar o computador e a Internet, sentem que têm que aprender um novo idioma; nós nunca estamos convencidos de que falamos este novo idioma bem o suficiente, e é preciso chamar um jovem para que nos ajude. Há uma mudança de hierarquia do conhecimento quanto ao acesso à informação, e comprovamos algumas vezes que jovens que se sentem nativos das novas tecnologias modificam as tradicionais hierarquias sociais de idade e, às vezes, as hierarquias estabelecidas no plano da educação e do socioeconômico. A partir desta abordagem começamos a pensar em outras formas de estranhamento. O que acontece, por exemplo, aos nativos que se vêem como estrangeiros no próprio país, que se sentem deslocados/desconfortáveis, exilados dentro de sua própria sociedade, “traídos” como se começou a dizer no período das ditaduras, das perseguições internas. Aqueles que saíram do país e, ao regressarem, sentem-se deslocados com relação a seu povo e seus hábitos. Acontecem outras formas de estrangeiridade, como no acesso a redes estratégicas de informação; alguns têm mais acesso a formas mais avançadas de conhecimento que outros, e tais assimetrias criam estrangeiros dentro da mesma sociedade. Ou ainda, há aqueles que não se sentem incluídos nas classificações legítimas da sociedade: é possível ser estrangeiro por opção de gênero, de religião. Mas o que estamos percebendo é que há uma organização das formas de inclusão e de estrangeiridade na sociedade contemporânea que pode adquirir muitas roupagens e que nos permite trabalhar a noção de “estrangeiro” também no que diz respeito ao desenvolvimento tecnológico e de outras mudanças socioculturais. Em determinado momento importante da pesquisa, tivemos uma oficina de elaboração do tema com base na metodologia das Ciências Sociais: Alejandro Grimson, antropólogo; Luis A. Quevedo, sociólogo da comunicação; Graciela Speranza, especialista em Literatura e Arte; Rosalía Winocur, mexicana especialista no uso da Internet entre os jovens; Jorge La Ferla, que trabalha com audiovisual e dirige o Festival Independente de Vídeo de Buenos Aires; Andrea Giunta, especialista e crítica de Arte; José Luis Brea, renomado especialista espanhol em História da Arte e crítica, também curador; e Carlos Amorales, que é artista visual. Elaboramos esse encontro buscando aproximar Arte, Tecnologia e Ciências Sociais, e tentando construir um objeto de estudo das estrangeiridades metafóricas, que são muitas vezes territoriais e que implicam novas formas de discriminação, segregação, organização da idéia de pertencimento e de exclusão nas sociedades atuais. ER: O grupo se propõe a estudar dois tipos de estrangeiridade: aquela gerada pelas mudanças tecnológicas e a relacionado à cultura. Como se pode estabelecer o limite entre o tecnológico e o cultural? NGC: Há alguns tipos de estrangeiridades estritamente culturais, como no caso do imigrante que volta a viver em seu país e percebe, por exemplo, como estão mudadas as leis e a dinâmica econômica. Em outros casos, percebemos que houve interação. A inclusão do uso dos celulares produziu uma reconfiguração das relações familiares. Hoje, por exemplo, o uso do celular possibilitou uma grande desenvoltura na relação entre os jovens e seus amigos, o que até então os pais desconheciam. São outros tipos de diálogo e outra linguagem: é a chamada “geração txt”. Isso acaba gerando uma autonomia ao adolescente muito mais cedo. ER: Como se pode trabalhar a partir do sistema educativo para reduzir as distâncias (e as novas estrangeiridades) produzidas pelas diferenças de acesso às tecnologias? NGC: Estes novos abismos criados dentro de uma mesma sociedade exigem uma reformulação do sistema educativo e de todas as formas de difusão da cultura. Na América Latina há uma grande resistência nas escolas para incorporar as novas tecnologias e também a indústria cultural de forma geral. Ainda existem educadores pensando que a televisão é a grande inimiga da escola. E durante décadas esse pensamento tem produzido uma nova geração que se socializa de uma forma na escola e de outra em casa, com os amigos. As novas tecnologias passaram por várias etapas. A primeira delas foi levar computadores para todas as escolas, e não deu certo; em função disso, a etapa seguinte foi formar os educadores para as novas tecnologias. Muitos jovens se acostumaram a ler e escrever nos monitores dos computadores e quando não encontravam computadores disponíveis nas bibliotecas, estabelecia-se um distanciamento dos jovens. Não se trata de dizer que hoje não se lê mais, mas é que se lê de outra forma. É por isso que as escolas devem reformular suas estratégias. ER: Ainda que as escolas não dêem o suporte necessário, hoje os adolescentes têm acesso à tecnologia em outros espaços. Qual é a contribuição específica que a escola pode dar em relação ao uso das TICs? NGC: A socialização das novas tecnologias se dá em diferentes pontos. Em uma pesquisa que fizemos no México, em 2005, sobre hábitos culturais da juventude, constatamos que não chegava a 30% o número de jovens que possuíam computador em suas casas, mas chegava a 70% os jovens com acesso à Internet em cibercafés. Possuir o computador em casa não é indicador de difusão e mudança de comportamento. No entanto, a produção de conhecimento não acompanha a velocidade da informação. Não se pode superestimar a imensidão de informação que a Internet proporciona, já que muitas vezes ela é caótica. Na verdade, o trabalho da escola é oferecer novas oportunidades para essa conceituação. ER: Em um contexto de produção coletiva e multicentralizada como é hoje a Web 2.0, de que maneira se pode validar a produção do conhecimento? NGC: Depende de que tipo de conhecimento estamos falando. No âmbito científico há formas digitais muito avançadas de validação. Em outros âmbitos são mais polêmicas, há muitos critérios. No caso da informação jornalística, a Internet trouxe a possibilidade de um controle maior sobre as informações geradas pelos grandes meios e, sobretudo, tornou possível uma multiplicidade de perspectivas diante de um mesmo assunto ou notícia. ER: Entre os jovens quais são as mudanças que se anunciam na cultura juvenil trazidas pela exposição às novas tecnologias? É possível pensar essas mudanças em perspectiva? NGC: Anuncia-se claramente uma reestruturação das redes sociais e culturais. Surgem novas formas de privacidade, interdependência. É um campo de estudos muito recente. Há várias televisores nas casas. Quase não se assiste à televisão em família. A exposição às tecnologias promove ao mesmo tempo uma maior valorização da autonomia em idades menos avançadas e um maior desenvolvimento de redes entre iguais ou semelhantes. É um hábito recente que se começa a estudar. De qualquer maneira, a velocidade das mudanças é espantosa. É difícil prever as mudanças em curso. É por isso que a pesquisa é reorientada a todo o momento. Podemos constatar e estudar os novos comportamentos, mas não é possível antecipar ou prever os impactos que eles terão no futuro. Fonte: Educared Argentina Tradução para o português: Gissela Mate 28/09/2007

21 abril, 2008

NOVA VISÃO SOBRE A HISTÓRIA DO BRASIL.


Uma das perguntas mais triviais e até infantis que se pode fazer é "Quem descobriu o Brasil?"A resposta seria mais simples ainda, foi Pedro Alvares Cabral, Certo?
Errado. O primeiro português a vir às terras brasileiras não foi Pedro Álvares Cabral, ao contrário do que até hoje ensinam os manuais de história. O primeiro pedaço de solo tupiniquim avistado pelos portugueses também não foi o Monte Pascoal, no sul da Bahia. O primeiro contato dos europeus com a terra brasilis muito pouco ocorreu em 22 de abril de 1500.
Recentes trabalhos de pesquisadores portugueses, espanhóis e franceses revelam uma história muito convincente sobre a chegada dos colonizadores portugueses ao Novo Mundo. O primeiro português a chegar ao Brasil foi o navegador Duarte Pacheco Pereira, um gênio da astronomia, navegação e geografia e homem da mais absoluta confiança do rei de Portugal, D. Manoel I. Duarte Pacheco descobriu o Brasil um ano e meio antes de Cabral, entre novembro e dezembro de 1498. O primeiro português a confirmar que existiam terras além do Oceano Atlântico desembarcou aqui num ponto localizado nas proximidades da fronteira do Maranhão com o Pará. De lá, iniciou uma viagem pela costa norte, indo à ilha do Marajó e à foz do rio Amazonas. Quando regressou a Portugal, o rei ordenou-lhe que a expedição deveria ser mantida em sigilo. O motivo para que a descoberta fosse tratada como segredo de Estado era bastante simples: as terras encontravam-se em área espanhola, de acordo com a divisão estabelecida pelo famoso Tratado de Tordesilhas, assinado em 1494, quatro anos antes de Duarte Pacheco chegar à Amazônia.
As novas pesquisas sobre a verdadeira história do descobrimento acabam definitivamente a inocente versão ensinada nas escolas de que Cabral chegou ao Brasil por acaso, depois de ter-se desviado da sua rota em direção às Índias.
O QUE PROVA TAIS AFIRMAÇÕES ? Até consolidar sua presença nessa - até então - desconhecida parte do mundo, portugueses e espanhóis se envolveram num fascinante jogo de traição, espionagem, blefes e chantagens. O mais recente trabalho a sustentar que Duarte Pacheco foi o verdadeiro responsável pelo descobrimento foi publicado no ano de 1996, em Portugal. Intitulado A construção do Brasil, é de autoria do historiador português Jorge Couto, 46 anos, professor da Universidade de Lisboa.
A base da tese gira em torno de um manuscrito, o "Esmeraldo de situ orbis", produzido pelo próprio Duarte Pacheco entre 1505 e 1508 e que ficou desaparecido por quase quatro séculos. Até no título, o documento revela seu caráter cifrado. "Esmeraldo" é um anagrama que associa as iniciais, em latim, dos nomes de Manoel (Emmanuel), o rei, e Duarte (Eduardus), o descobridor. "De situ orbis" significa "Dos sítios da Terra". "Esmeraldo de situ orbis", portanto, era "O tratado dos novos lugares da Terra, por Manoel e Duarte". Era um imenso relato das viagens de Duarte Pacheco Pereira não só ao Brasil, como à costa da África, principal fonte da riqueza comercial de Portugal no século XV. O rei D. Manoel I considerou tão valiosas as informações náuticas, geográficas e econômicas do "Esmeraldo" que jamais permitiu que ele fosse tornado público. Foi montado em cinco partes, com 200 páginas no total. As melhores provas sobre o descobrimento do Brasil aparecem no capítulo segundo da primeira parte. Resumidamente, o trecho diz o seguinte:
O documento era, de fato, tão precioso que uma cópia foi contrabandeada em 1573 para a Espanha por um espião italiano, Giovanni Gesio.Depois que o espião pirateou um exemplar para a Espanha, alguns historiadores começaram levantar a hipótese da vinda de Duarte Pacheco ao Brasil antes de Cabral. O peso da visão tradicional da história e a linguagem enigmática da passagem referente à viagem de 1498 contribuíram, porém, para que essa fosse considerada, até agora, uma versão fantasiosa. Para sustentar a sua tese, Jorge Couto cruzou dados sobre as relações políticas entre Portugal e Espanha em 1498, debruçou-se sobre interpretações minuciosas do "Esmeraldo" e dos mapas da época, estudou os métodos usados no final do século XV para calcular a longitude e recorreu a relatos históricos sobre as antigas populações indígenas da Amazônia e aos resultados das recentes pesquisas feitas pela arqueóloga americana Anna Roosevelt em Santarém e na ilha do Marajó, no Pará
Em Portugal, o livro de Jorge Couto tornou-se uma referência obrigatória. Entre os principais historiadores portugueses, não há dúvidas de que Duarte Pacheco chegou ao Brasil antes de Cabral", menciona José Manoel Garcia, pesquisador português especializado em História dos Descobrimentos. "A viagem de Cabral continua a ser considerada o descobrimento oficial do Brasil apenas por uma questão de tradição e de comodidade." Não é só em Portugal que Duarte Pacheco é reconhecido como o responsável pelo descobrimento do Brasil. O espanhol Juan Gil, da Universidade de Sevilha, e o francês Serge Gruzinski, do Centre Nationale de Recherches Scientifiques, também fazem essa afirmação em trabalhos publicados, respectivamente, em 1989 e 1992, mas sem a requeza de tantas evidências e provas como Jorge Couto. 1498: GUARDE BEM ESTE ANO...
Em outubro de 1498, o rei português D. Manoel I viu frustradas as suas ambições de subir também ao trono da Espanha, depois que morreu sua mulher, dona Isabel, filha dos reis católicos Isabel de Castela e Fernando de Aragão. Perdeu assim sentido a política de boa vizinhança que ele vinha desenvolvendo com os espanhóis. D. Manoel I resolveu, então, mandar uma expedição para descobrir terras na "parte ocidental, passando além a grandeza do mar Oceano". A parte ocidental era onde ficavam as terras descobertas pelos espanhóis nas Américas, na primeira expedição comandada por Cristóvão Colombo em 1492. O mar Oceano era como os portugueses chamavam o Oceano Atlântico. A expedição deveria também determinar, no local, a linha imaginária traçada pelo Tratado de Tordesilhas para funcionar como marco divisório dos domínios portugueses e espanhóis no mundo. Para a missão, d. Manoel I escalou o melhor homem que tinha à disposição. Duarte Pacheco era um exímio navegador, como tinha demonstrado na costa da África, era da sua total confiança e, o mais importante, tinha sido um dos conselheiros técnicos de Portugal nas negociações do Tratado de Tordesilhas.Após ter recebido as ordens do rei, Duarte Pacheco zarpou, em novembro de 1498, do arquipélago de Cabo Verde, na costa da África, em direção à linha do Equador. Os historiadores ainda não encontraram evidências para confirmar se ele partiu com apenas uma ou com duas caravelas. Navios de pequeno porte, elas eram usadas em expedições de exploração. Para ocupar territórios, os portugueses e espanhóis usavam naus e galeões, navios maiores, com grande capacidade de carga. Duarte Pacheco continuou navegando para o Sul até que avistou terra na região que hoje é fronteira entre o litoral do Maranhão e do Pará. A partir desse ponto, favorecido pela corrente marítima das Guianas, Duarte Pacheco não teve dificuldades para iniciar uma viagem pelo litoral brasileiro que foi até a Ilha do Marajó e a foz do rio Amazonas.
DUARTE PACHECO PEREIRA NO BRASIL
Durante o trajeto, Duarte Pacheco encontrou populações compostas de homens "pardos quase brancos". Essas eram justamente as características físicas dos índios aruaques que dominavam a orla marítima do Norte do Brasil. Os estudos da arqueóloga Anna Roosevelt comprovaram que toda essa região era habitada por populações indígenas com alta densidade demográfica e que criaram na ilha do Marajó uma sociedade complexa, de escala urbana e produtora de um artesanato até sofisticado, como a célebre cerâmica marajoara. Isso explicaria a referência de Duarte Pacheco ao Brasil como uma "terra grandemente povoada".
Embora não haja comprovação de que o navegador português tenha rezado também a primeira missa do Brasil em solo amazônico, existem indícios. Há relatos de navegadores espanhóis que teriam encontrado uma grande cruz na região da foz do Amazonas. Na volta a Portugal, os resultados da expedição foram mantidos sob absoluto sigilo. Uma cláusula do Tratado de Tordesilhas obrigava Portugal e Espanha a comunicarem ao outro reino as ilhas e terras descobertas em domínios alheios. Ora, todas as terras descobertas ficavam na área dos espanhóis. O rei d. Manoel I, que não tinha mais como subir ao trono espanhol, calou para não dar munição de graça aos concorrentes. O silêncio sobre a expedição de Duarte Pacheco foi apenas mais um golpe baixo na feroz competição que portugueses e espanhóis travavam no final do século XV. Na luta pela hegemonia na Península Ibérica e para ver quem primeiro descobriria o caminho das ricas especiarias das Índias, Portugal e Espanha.
VOLTA DE PACHECO A PORTUGUAL: GLÓRIA E MORTE
Depois da expedição à costa brasileira em 1498, Duarte Pacheco foi para a Índia entre 1503 e 1505. Lá, cobriu-se de glória ao derrotar em sucessivas batalhas, com poucas centenas de soldados, milhares de inimigos comandados pelo rei da cidade indiana de Calecut. Na volta a Portugal, Duarte Pacheco ganhou uma recepção triunfal do rei d. Manoel, que lhe concedeu a raríssima honra de o colocar ao seu lado na procissão comemorativa que percorreu as ruas de Lisboa.
Depois da subida ao trono português de d. João III, Duarte Pacheco, por ser integrante de um grupo político muito próximo a d. Manoel, caiu em desgraça. Foi preso sob a acusação, aparentemente caluniosa, de contrabando de ouro na África e ficou meses encarcerado em Lisboa. Mais tarde, foi reabilitado, mas morreu em 1533 na pobreza e totalmente afastado das decisões políticas.
ONDE FICA PEDRO ALVARES CABRAL NESTA HISTÓRIA
A maior parte dos hstoriadores que pesquisam o descobrimento, são unanimes ao dizer que o "descobridor" oficial do Brasil compõe uma pálida figura. Cabral não entendia quase nada de navegação, mas era oriundo da média nobreza - teve a sorte de casar com uma das herdeiras de uma das famílias mais ricas do reino. Foi assim que conseguiu ser escalado para comandar a maior armada que Portugal já montara. Pela quantidade de homens e naus, a expedição de Cabral é mais uma prova de que os portugueses vinham para tomar posse do Brasil e usá-lo como base de apoio da rota para as Índias. Ele partiu do rio Tejo, em Lisboa, com cerca de 1,5 mil homens e 13 embarcações (nove naus, três caravelas e uma naveta de mantimentos). Apenas para comparação: quando chegou às Índias em 1498, Vasco da Gama viajou com apenas três embarcações. Oficialmente, a missão de Cabral era estabelecer uma feitoria comercial na cidade de Calecut. Esse era o motivo da presença na expedição de Pero Vaz de Caminha - o autor da "certidão de nascimento" do Brasil seria um dos escrivães de despesa (uma espécie de contador) do entreposto comercial a ser criado na Índia. Os portugueses acreditavam que o Brasil se encontrava mais próximo do Sul da África do que realmente está. Após a viagem de Cabral, perceberam o erro e só partiram para a ocupação do Brasil 30 anos depois.Portanto o ano de 1500 marca para a História do Brasil o surgimento das bases da colonização portuguesa, e nunca o descobrimento do Brasil.
NADA ACONTECE POR ACASO, NEM O DESCOBRIMENTO DO BRASIL
Entre os historiadores, é quase consensual que Cabral partiu de Portugal com instruções secretas do rei d. Manoel para chegar às terras já descobertas por Duarte Pacheco. Em 1979, o comandante Max Justo Guedes fez sobrevôos na costa de Porto Seguro (BA), na altura da gávea da nau de Cabral para verificar as condições de navegação em que foi avistado o Monte Pascoal, em 22 de abril de 1500. Na carta de Caminha, ele é descrito como um monte cônico com "serras mais baixas ao sul dele". Segundo o estudo, esta visão do morro só ocorre quando se navega de Sul para Oeste (como se Cabral tivesse alcançado o litoral à altura do Espírito Santo e subido em direção à Bahia), o que demonstra que ele estava em busca de terras. Se tivesse chegado ao Brasil por acaso, Cabral estaria navegando na direção Norte-Oeste. "A descoberta foi intencional", sustenta o comandante Guedes. "A tese de que Cabral chegou ao Brasil por acaso não encontra mais respaldo entre os historiadores", corrobora Laura de Mello e Souza, professora da Universidade de São Paulo (USP).
Ao alcançar Porto Seguro, a esquadra tinha 12 embarcações (uma se perdeu no caminho e depois conseguiu retornar a Portugal). Cabral ficou apenas uma semana, rumando para a segunda etapa, mas fracassou na missão de estabelecer a feitoria em Calecut. Um ataque de surpresa dos hindus, atiçados por comerciantes muçulmanos, destruiu a feitoria e massacrou vários portugueses, entre eles Caminha. Cabral voltou a Lisboa com apenas seis navios. Entrou depois em atrito com o rei e não voltou mais a comandar expedições marítimas. D. Manoel I teria justificado a decisão com o argumento de que Cabral não era "um homem com muita fortuna no mar".O que teria sido o grande feito da sua vida, o descobrimento do Brasil, só foi divulgado um ano depois que a carta de Caminha chegou a Portugal. Isso demonstra a pouca importância que os portugueses deram à expedição de Cabral - mais um indício de que se tratava, realmente, da segunda viagem ao Novo Mundo. Quando comunica o fato aos reis espanhóis, d. Manoel I, cinicamente, o atribui a um ato milagroso. Até recentemente, a casa que pertencera à família de Cabral, em Santarém, cidade portuguesa onde está o seu túmulo, funcionava como um prostíbulo. Estavaa sendo agora restaurada por causa das comemorações do ano 2000.